28/04/2010

O que posso

A minha vó
a minha velha
velha boa:
sorriso e Cecília.

À minha vó
tudo a ela
o que posso
apenas.

Pouco choro, muito amor e uma vela:
todo dia.

27/04/2010

O primo voltou
alegre
belo
lindos olhos
voltou.

Voltou primo
pé no chão
mão na mão
pé com pé
do mesmo
sapato
calço-família.

A vó foi.

O primo
voltou
homem
voltou.

Mulher?
mas
como?
eu
não
eu
talvez
eu
sou

Mas pra primo
nada mais chato
óbvio
nada
mais
reconfortante.

Eu não sou Ana
não sou olhos boca
não sou.
E nem seios
nem beiço.

Ô primo.

Sou só
família
menos
língua
sou tátil
sempre frágil,
menina
sou prima
e
sempre
e pra mim
mesma
anos luz atrás
e a frente,

anos nós.

Aqui
o

clã

únicos

coração.

Voilá:
o primo
voilá:
eu voltei.

19/04/2010

Sincronia

Supra
o sumo
que é a poesia

Com
a vida
e o tesão
que há no dia-a-dia.

16/04/2010

Fogo n´água suja

Também não quero ficar te vendo nú,
o cheiro molhado basta já.

Castra a vontade
uma mágoa encandecida.

Desejo que não bate
mas fica:
fumaça da água fria numa panela quente
ou de fósforo
ou guimba
que se apaga no vaso sanitário.

14/04/2010

Perdi.

Buraco sem fundo
sem nome,
pronome

muita causa, pouco efeito
nada feito

bailando no ar,
ora sou
ora arrisco

às vezes amo.

Buraco sem nome
pronome
sem fundo

Afundo?
Arrisco.


Sempre escuro
longe e tudo
perto
do umbigo
claro
do mundo

Vida passa em paralelepípedos.
Cansados de tensão e prazer.

Me encontro no ar que vivo,
vivemos nos humores meus,
seus,
vivemos nos nossos desejos,
tesões,
tédios.

E o ar em torno
É pesado, nuvem preta,
ou colorido grama jardim.

Me ligo no meu desejo quando expiro esse ar

Cada respirar é um não
ou então essa dor
que aspira ao mundo inteiro.

13/04/2010

na curva

Fim do mundo,
fora de tudo,
longe de você,
perto do teu desejo.

Eu vou
se você não for
mas se for
relembre
que eu estou aqui
até encontrar
um lugar em que você não esteja
e aí,
aí sim,
ficaremos juntos.

07/04/2010

Sonho é reles
sonho é pouco
se eu, parca,
medíocre,
sou objeto
que te desejo.
Eu vou dar no couro
vou fugir
sabotar meu consolo
proferir
que já fui
desde quando
vc me quis
e eu já tinha desejado
não estar nunca mais
aqui
Sonolência que acaba de acordar
que me pega pelos tornozelos
quer bocejar os sonhos, pra fora
mas depois correr atrás, pelas janelas, portas, pelo sonho que sonhou

Esfomeada
quer no café-da-manhã comer a vida

05/04/2010

De quantas formas eu me calo?
Por qual medo eu não me espanto,
não berro, não urro?
E será que eu só engulo meu susto?

Por que não falo?
Que razão é essa?
Que razão presta
pra aniquilar o que sinto?

Depois de me calar,
tudo o que eu digo, ando, faço,
dolorida,
eu minto.

04/04/2010

coisas que eu penso quando sinto a vida parada


Eu posso não acreditar em mais nada.
Mas não há como não acreditar na vida.
A vida é.
Antes de se inventarem os objetos,
ser
é um verbo intransitivo.
mundo manco, um tamanco só.
mundo banguela, buraco onde a dor jorra
encharca o mundo -
mas bate e não volta
pois quem recebe
faz de conta que não sentiu
o sangue
elameando cada testa
entrando pelas narinas
e se instalando
em cada coração.

03/04/2010

Um espancamento bastaria
pra secar esse poço de raiva
incessante

Jorra feito água
feito raiva
e é claro
feito razão

Feito que está arraigado
feito que me faz,
que me refez

desde quando eu me engoli:
meu modo, minha vontade

Como gota que não cessa
gota constante
gota
que se espalha sem limites

Carcaça que atravanca:
me arranca
porque me rói
e já nem dói
apenas me move,
me abre e atiça,
eme joga ao ar
nessa pirambeira também espinhosa.

A raiva passa
quando vira SOCO,
isto é,
quando vira um salto
dessa minha vida,
que é como o pensamento,
pra quaisquer melhorer dias
que são como:
dia-a-dia
explosiva,
a minha ação.

01/04/2010

Aliteração

viajar
ou partir pruma viagem só
no mesmo lugar de enlouquecer?

transloucar partido,
ou viajar, uma via móvel?

não sabia.
nunca soube.

se essa calma é um silencio paz
ou se essa paz é um descuido morte

historinha de Mestre/discípulo...

fábula que escutei numa roda de conversa...
(adaptada)

- Parece que têm dois lobos dentro de mim, brigando... Eles querem coisas opostas... Como vou saber qual deles sou eu realmente?
- Você é o mais forte, o que vencer a briga.
- Mas qual lobo vai vencer?
- Aquele que você alimentar."